quarta-feira, 20 de junho de 2012

Uma reflexão sobre o Açude Castanhão

Nestes tempos de estiagem no Ceará, eis artigo do engenheiro Cássio Borges intitulado “O Açude Castanhão e o Baixo Jaguaribe”.
Poderia estar falando em seca, que é o tema atual, e não em enchentes, mas por um dever de consciência profissional, vou me reportar, neste artigo, sobre a longa discussão havida se o Açude Castanhão controlaria ou não as enchentes no Baixo Jaguaribe, no Estado do Ceará, um acalorado debate que durou quinze anos. De início, refiro-me à informação passada à sociedade cearense de que os que eram “contra” a construção do referido açude diziam que “o Açude Castanhão não encheria nunca”.
Em artigos anteriores, publicados na imprensa, eu dizia que no ano de 1985, quando houve a maior enchente já registrada em toda a região nordestina, havia escoado, ou transitado, na seção do Rio Jaguaribe, no local do Açude Castanhão, 20,5 bilhões de metros cúbicos de água. Ora, como é do conhecimento do leitor, a capacidade total de acumulação do referido reservatório é de 6,7 bilhões de m3, portanto três vezes menor do que o volume d`água acima mencionado. Como que poderia ter sido eu o responsável por tão descabida e insensata declaração?
No meu livro “A Face Oculta da Barragem do Castanhão”, editado em 1999, na página 197, cito que no local do Açude Castanhão, nos anos de 1924 e 1989, escoaram 19,3 e 9,1 bilhões de metros cúbicos de água, respectivamente. Portanto, somente a citação destes três anos (1924, 1989 e 1985), devidamente registrados no livro acima citado, já seria suficiente para me eximir de tão incoerente declaração, somente atribuída a quem não tem conhecimento das reais características hidrológicas do Rio Jaguaribe. Ou, para quem não tem o menor compromisso com a comunidade técnica nordestina e brasileira e o devido conhecimento da Ciência Hidrológica, o que me parece mais provável.
A bem da história do Açude Castanhão, transcrevo do conceituado professor Nilson Bezerra Campos, o seguinte trecho do seu artigo publicado na Revista Engenharia (ASTEF, vol. 7,nº 9, de 1991) sob o título A Questão do Açude Castanhão: Teses e Antíteses: “…dizem os defensores que o Castanhão acabaria definitivamente com as inundações do Baixo Jaguaribe. Os opositores argumentavam que o Castanhão, com sete bilhões de metros cúbicos “nunca encheria”. Veio o inverno de 1989. Escoaram no Boqueirão do Cunha sete bilhões de metros cúbicos. As duas teses estavam derrotadas”. (Boqueirão do Cunha é o local onde o Açude Castanhão foi construído).
Sobre as inundações no Baixo Jaguaribe que os defensores desse empreendimento diziam que, com o Açude Castanhão iriam desaparecer definitivamente, o professor Nilson Bezerra Campos demonstrou, apenas com o inverno de 1989, que não foi dos maiores, que “esta tese estava derrotada”. Com mais razão ele teria se tivesse tomado como referência as enchentes do ano de 1985, três vezes maior do que aquela. À margem dessa discussão de pessoas despreparadas que nunca viram a capa de um livro de hidrologia, ou movidas por outros interesses, a impressão que sempre tive é que esta conversa de que o Castanhão “nunca encheria” era mais um argumento sustentado pelos seus próprios defensores que apregoavam como um dos seus maiores benefícios o controle definitivo das enchentes no Baixo Jaguaribe, cuja população ainda estava traumatizada com o cenário devastador na região, com inundações realmente catastróficas ocorridas no inverno ano de 1985.
* Cássio Borges,
Engenheiro e um apaixonado pelo Dnocs.

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